Editorial 11 - Dezembro/2019

Este segundo número online da revista Arteira é o 11º. de sua história. Em 2019 adotamos a prática de publicação em fluxo contínuo, compondo gradativamente o conjunto que agora apresentamos. Dessa forma, foi possível disponibilizar com mais agilidade aos leitores diversos textos que refletem o trabalho desenvolvido na EBP – Seção Santa Catarina – no período 2018-2019.

O tema-título da XIII Jornada da EBP - Seção SC - Submissão, subversão e a heresia do sinthoma, orientou os textos reunidos sob a rubrica Falando em.... Para começar, contamos com A heresia analítica, seminário que Clara Holguín ofereceu como convidada da jornada. Ela parte da pergunta “sobre qual ‘garantia’ que faria falta para responder aos impasses de uma época caracterizada pelo declínio do Outro enquanto aquele que representava o lugar da norma e da proibição”. Seu ponto de chegada é a indicação de que, para nós, “hereges lacanianos”, tal “garantia implica a submissão e a subversão, pois ela coloca em jogo tanto a solidão subjetiva quanto o laço com o Outro”.

Em A escrita inscrita no corpo pode ser subversiva Cinthia Busato vale-se de uma referência ao trabalho do artista basco Eduardo Chillida para apontar que são os movimentos em torno do vazio, “os movimentos que fazemos para elaborar em torno dessa opacidade que constroem nosso trajeto singular e, às vezes, subversivo.”

Sob o título Éfeito de ato, Leonardo Scofield aborda a submissão ao “Outro, lugar do sujeito”, e a partir daí traça o caminho que o leva a concluir: “Orientar-se pela heresia do Sinthoma consiste, para mim, em saber que o poder é do S1 e que submetê-lo às significações não exclui o ponto inidentificável do gozo.”    

Oscar Reymundo, em Subversões, destaca, logo de início, que a psicanálise se caracteriza por ser subversiva, e não revolucionária, e esclarece que a “ a psicanálise é subversiva, porque subverte os imperativos do seu tempo”. Por essa via, ele chega à proposta de que chamemos de “herética” a “uma nova referência” que orienta nossa prática hoje, a partir do momento em que “a subversão lacaniana” ultrapassa a lógica fálica com a formalização do gozo não-todo fálico.

Em Psicanálise, subversão dos gêneros, Luís Francisco Espíndola Camargo ilustra essa dimensão subversiva da psicanálise ao apontar que Freud indicou, já em 1905,  “que nos seres-humanos não existe uma ligação pré-determinada entre o sexo biológico e a escolha de objeto” antecipando o que propõe e desenvolve em seu texto como “a subversão lacaniana das teorias de gênero”.

Fred Stapazzoli, em Submissão, subversão, destaca no tema-título da XIII Jornada – Submissão, subversão e a heresia do sinthoma, “um movimento do universal ao singular – inclusive em termos conceituais”. Um movimento que, na orientação lacaniana, ante o fracasso do sentido, se dirige “aos confins do significante, desatrelado do sentido e em direção à letra, que revela a opacidade do gozo em sua vertente real”. Aí localiza a heresia de Lacan, que, acentua, “não foi possível sem a prática dita ortodoxa, aquela não desvinculada do sentido”.

Passando à rubrica Formação do psicanalista da Escola, temos inicialmente o texto de Simone Souto – A formação do analista e a política da psicanálise – que corresponde à sua fala como convidada no âmbito do projeto O ensino na Escola, desenvolvido ao longo de 2019. Partindo pergunta “o que é um psicanalista?”, Simone, após uma introdução ao tema, vai discorrer sobre aquilo  “que, na primeira e segunda décadas do século XXI, temos recolhido de novo, no que diz respeito ao final de análise e ao analista como produto dessa experiência”, sob a perspectiva do sinthoma e do “ultrapasse”, remetendo ao curso ministrado por Jacques-Alain em 2010-2011 Miller L’être et l’Un (O ser e o Um). Finalmente, ela aborda a política da psicanálise, formulando que “a ideia é levar a psicanálise e os psicanalistas para o campo político e não trazer a política e sua lógica partidária para a psicanálise”.

As contribuições de Cleudes Slongo – Impasses e limites da supervisão – e de Sandra da Silveira – Supervisão e ato analítico -  foram originalmente apresentadas na atividade desenvolvida em torno dessa questão diretamente vinculada à formação do psicanalista. Cleudes acentua questões relacionadas à transferência na relação com o supervisor e os limites da transmissão daquilo que se passa na sessão analítica. Sandra, por sua vez, discorre sobre os motivos da demanda associados às diferentes vertentes da supervisão, localizando nesse quadro o horror ao ato analítico a partir de uma experiência vivida.

O Fazendo artes traz, sob o título Pais sem paz ou pais sem pais, comentários de Diego Cervelin em torno de dois filmes exibidos na atividade Psicanálise vai ao cinema, que o autor classifica “entre os mais inquietantes”: Dente canino, de Yorgos Lanthimos, e Miss Violence, de Alexandros Avranas. Seus comentários têm como eixo aquilo que o título já anuncia, a questão dos pais, que, nesses filmes, “já não são patriarcas nem amáveis nem odiáveis”.

Finalmente, a seção Tecituras analíticas acolhe a contribuição generosa de Guy Trobas – Um significante não tão qualquer – em que compartilha sua leitura sobre o significante da transferência e o significante qualquer como tais, sobre a entrada possível em análise, o final das entrevistas preliminares, a passagem ao divã e o tratamento analítico, articulando essas pontuações teóricas com um caso clínico de sua prática como analista.

Agradecemos a bela capa deste número 11 a Alana Tedesco, jovem artista, participante da EBP-Seção SC, que, em suas próprias palavras, “aventura-se na arte da colagem desde a pré-adolescência, quando, numa crise com a própria imagem, decidiu cobrir os espelhos de seu quarto com um grande mural de colagens feito com revistas teen da época. Em outras palavras, acredita mais na precisão dos cortes, nos deslocamentos de espaço e na potência dos contornos, como ferramentas para ter notícias de si, do que na imagem refletida no espelho”.

As imagens que ilustram os textos são de Hannah Höch, artista alemã, precursora das fotomontagens que se integra ao movimento dadaísta no começo do século XX. Essa especificidade das montagens marcaram uma época importante nas artes plásticas e nos movimentos de vanguarda, que vinham, justamente, na esteira d’A interpretação dos sonhos de Freud. Nas fotomontagens de Höch, podemos acompanhar sua crítica política, sobretudo ao nazismo, e também suas elucubrações sobre o corpo feminino e o lugar da mulher mostrando que colar, recortar, montar, justapor, deslocar, tanto nas artes quanto nos sonhos, são operações que movimentam as imagens do mundo num exercício que nos ajuda a ler e a compor a história e a vida.

Seguimos rumo a 2020 e ao número 12.

Louise Lhullier e Flávia Cera

ESCOLA BRASILEIRA DE PSICANALISE - ESCOLA DO CAMPO FREUDIANO
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